A história deste blogue
Me chamo Edivaldo Júnior, sou um
paraibano formado em História, já escrevi sobre o passado de uma editora
prestigiadíssima (cf. o único blogue Não Oficial da Nova Aguilar no Brasil) e
artigos de opinião em mais um blogue, de nome Tabloid G4, que mais eram
exercícios de redação que outra coisa útil. Já escrevi também em outro espaço
(site Arauto da Verdade), há não mais que quatro anos, dissertando sobre
assuntos atinentes à piedade católica tradicional, bem como sobre a história do
catolicismo no Brasil. Minhas incursões não param por aí: dei inicio às atividades editoriais da casa Triregnum, publicando até o presente mais de dez títulos pelo selo.
Mais uma vez, desta feita nesse
novo endereço, escreverei uma série de artigos sobre um assunto bastante
específico, sem a intenção de esgotar totalmente as nuanças do mote; assunto,
aliás, que corre nas veias de minha família há pelo menos quatro gerações: o
comércio.
Começou com meu avô, Ednaldo Cordeiro Pinto, senhor visível e
invisivelmente descendente de portugueses, que após o casamento com a sra.
Aurora Gomes, na pequena Serraria (PB), ainda na década de 1950, decidiu bater
pernas até o Rio de Janeiro a fim de procurar um emprego. O plano de então era
acumular um mealheiro ou cabedal que sustentasse a família paraibana e servisse
como capital para uma futura mercearia, pois que antes meu avo já tinha sido
empregado em um comércio tradicional da cidade (e convivido bem com estoques
cheios e patrão rigoroso). Com a primeira filha, não havia tempo a perder e o caminho da prosperidade parecia passar longe da cidade natal.
E ele trabalhou. Meu avô me contou
que, para fazer o dinheiro ir acumulando e render bastante, morou por quase
todo o tempo de trabalho no Rio em uma pensão doméstica de uma senhora bastante
simpática, cuja casa distava não muito da rede de hipermercado onde ele passou
a labutar desde que embarcou no pau-de-arara e desembarcou na capital do país.
Viagem cansativa, num pequeno caminhão que percorria estradas vicinais, de
terra e buracos, feita em confortáveis assentos de madeira crua e onde o
descanso se encontrava no regaço das redes dependuradas nos hotéis de beira de estrada.
Nas palavras do primeiro, “uma loucura”. E diversão na cidade maravilhosa? Só
mesmo nas brincadeiras cotidianas entre amigos “sem futuros” e visitas à Praia
do Botafogo por meio do bonde, que se não tivesse cuidado “passava por cima”.
Terei oportunidade de falar mais a
respeito do que meu avô contou sobre a experiência, mas sobre os envolvidos,
posso dizer que depois veio meu bisavô, meu pai e eu mesmo, nessa exata ordem,
todos envolvidos no comércio de secos e molhados. Com o pouco que escrevi, porém, já posso adiantar
bem qual é o propósito deste endereço: falar sobre cores, cheiros, sabores,
risos, tristezas, vigor e decadência de uma modalidade comercial que ainda
persiste em todas as cidades do Brasil, e que projeta sua sombra não dentre os
arranha-céus das cidades, mas na vida dos brasileiros apressados, que param na
birosca ou bodega do caminho de casa para comprar o alimento que a família em
casa consome – ou para tomar a aguardente de lei ou fumar o cigarro de sempre.
A Mercearia ou Bodega é uma
instituição nacional, e assim como os estudantes ou os cemitérios, outras
personagens que no dizer de Gilberto Freyre mereceriam sua própria história em
formato de livro, ainda não possui um cronista, seja de que quilate for, que
faça uma descrição profunda de seu passado, presente e futuro. Isso é
importante, pois que todo um conjunto de gerações lidou com este comércio
específico e dele pouco se falou até agora, o que não destoa muito do descaso
que vemos para com outras expressões culturais nacionais, como o Cordel (forma
literária que pesquisei bem a fundo durante meu curso e que, vergonha das
vergonhas, franceses e espanhóis mais conhecem que nós mesmos) ou os Cantadores itinerantes e suas disputas no meio rural do Nordeste. Não que faltem leitores, muito pelo contrário: faltam docentes
com seriedade e perspicácia, que percebam sobretudo que a verborragia acadêmica
não interessa ao operário ou ao empresário que, ao final de um dia cansativo,
chega estafado à sua casa. A vida real é bem mais árida do que a fantasia de
Paulo Freire ou Michel Foucault pintam, e bem menos cheia de intrigas e mesquinhagens do que
pressupõe M. de Certeau. A Universidade deve se dedicar, isto sim, a trabalhar
em favor de quem lhe sustenta com pesados encargos tributários, revertendo em
conteúdos e estudos necessários e objetivos, que valorizem o que há de mais
importante em nossa cultura, cuja memória se perde pela inépcia de nossos
cientistas e estudantes desleixados.
É por esta necessidade e por outra
bem mais particular – a de guardar estas memórias – que passarei a escrever
sobre os merceeiros e suas casas comerciais.
Espero que apreciem o que há de
vir.
Comentários
Postar um comentário